sexta-feira, 2 de outubro de 2009

O Vazamento das Provas do ENEM X Realidade Educacional Brasileira


Mais uma vez o Brasil recebe perplexo uma notícia terrível sobre a capacidade de organização na educação brasileira. Bastou o ENEM ganhar um peso maior no contexto universitário (servindo em muitas instituições federais de ensino superior como único critério de entrada) para que a prova, ou melhor, as provas fossem "misteriosamente" surrupiadas e fossem parar nas mãos de pessoas também "misteriosas", sabe-se lá desde quando.
Coisas desse tipo retratam bem a realidade do ensino brasileiro. Encontramos vários problemas orgânicos em nossa educação. Não temos uma organização minimamente confiável para nos dar garantias básicas de que um dia poderemos ter uma educação de qualidade em nosso território. O episodio do vazamento das provas do ENEM ilustram maravilhosamente bem o quão distantes estamos de termos algum tipo de qualidade em nossa educação. Não adianta termos apenas boas teorias pedagógicas para transformarmos nossa educação (mesmo essas teorias pedagógicas sendo essenciais), não basta que, nós professores, nos esforcemos em mudar nossa realidade (mesmo esse esforço sendo essencial). É necessário que tenhamos políticas públicas sérias que sirvam de suporte pra todo plano teórico educacional. Ora, se não conseguimos nem ao menos manter o sigilo de uma prova, que coloca em jogo o destino de mais de quatro milhões de inscritos, como podemos sonhar com dias melhores? Não sejamos enganadores de nós mesmo e não banquemos os defensores do "pedagogês" ridículo que muitas pessoa teimam em defender. Essa história de que basta que os professores façam isso, basta que apliquemos a teoria disso ou daquilo, basta que os professores façam diferente, etc, etc, etc, não passa de uma ridicularidade de que tem um horizonte intelectual reduzido.
A inexistência de políticas públicas sérias, de um sistema de ensino organizado organicamente, de pessoas preparadas (ou pelo menos que saibam o que é uma sala de aula) para assumirem cargos estratégicos para educação brasileira, impossibilita drasticamente uma mudança em nossa realidade educacional e, em casos como o do vazamento da prova do ENEM, nos rouba até mesmo uma perspectiva de dias melhores.
Queria terminar com uma comparação interessante. Imaginemos que as teorias educacionais e de ensino sejam os livros de uma estante, e imaginemos essa estante cheia desses livros. Agora, por outro lado, imaginemos que as políticas públicas sérias para educação sejam uma mesa, e que essa mesa seja muito pequena. Com uma mesa tão pequena não seríamos capazes de abrir todos os livros da estante sobre ela. Haveria uma desproporção entre a grandiosidade dos livros da estante e o tamanho reduzido da mesa e, consequentemente, uma impossibilidade de um bom trabalho nesse contexto.
É assim que vejo a nossa realidade educacional. Temos grandes teorias e muitos sonhos de utiliza-las, todavia, não temos uma política educacional séria que nos dê o suporte necessário para tornarmos isso possível, principalmente em um país onde não conseguimos nem manter o respeito a nossos estudantes, e deixamos vazar por aí as provas de um exame tão importante, sobretudo esse ano, como o ENEM.

Profº Adriano Vieira (graduado em História-UNIFSJ)

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